terça-feira, 27 de outubro de 2009

Há tanto que pouco me dão...


Preciso de puxar um pouco ao sentimento. De desapertar o nó que foi dado na garganta. De soltar a voz nas palavras, numa espécie de desabafo, inaudível, apenas sonoro quando lido em voz alta.
No recanto do meu quarto, previamente criado e decorado para ser o meu canto especial em casa, encontro-me comigo e com o meu coração, aquele que devia estar machucado mas que eu insisto em sarar colocando constantemente pensos rápidos para não ter de enfrentar a dor. Deixá-lo quebrar porque se sente só? Para quê? Não preciso de sofrimento quando já pouca alegria possuo. Tristeza…
Sinto a luz ténue percorrer o meu corpo, vejo as sombras criadas no caderno pela minha mão que incansável escreve para não arrefecer o meu pensamento que fervilha numa inquietude penetrante e angustiante.
Como é possível estar tão rodeado e ao mesmo tempo estar tão despojado? Que pretendem de mim aqueles que chegam de mãos cheias de nada e de falsas promessas? Escuto. A minha respiração, o cortinado roçar a janela provocado pela brisa fraca que toma de assalto o arrepio da pele. Escuto. O movimento na rua, os candeeiros que agora iluminam a noite que chegou mais cedo. A lágrima que percorre o meu rosto… O sabor acre da solidão.
Que vem aí? Quando chegará até mim?
Quero entregar-me, quero ser eu, quero se aconchegado. Mas o carinho não chega, o abraço fica longe, e só ter uma amizade não é suficiente.
Sinto-me egoísta! Sinto-me amarrado a um egoísmo idiota e arrogante por me deixar ir abaixo, por me sentir só e estar cansado de ter apenas um vislumbre do que preciso, agora!
Não quero mais brincar. Não quero mais que tenha de ser tudo tão complexo e complicado. Não quero mais ser somente eu. Preciso de um sorriso, sincero. De uma mão dada, quando o meu mundo ruir. De um olhar em segredo, para me aconchegar. De um afecto a dois, de uma compreensão, de mais do que um amigo. Estarei a ser pretensioso ao pedir demais? Como, se há tanto que pouco me dão…

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Ansiedade


Ansiedade. Feroz e inquietante.
Ansiedade. Mordaz e autoritária.
Ansiedade!
Estado de espírito inquieto e que me tira o sono, pesadelo noctívago que me ataca sem piedade, mente que fervilha velozmente perdida entre mil e um pensamentos. Ansiedade. O batimento cardíaco acelerado, a pulsação que corre sem parar, os olhos abertos, cansados, como se esperassem uma qualquer reacção. Esgotado.
O corpo treme, a voz falha, tudo geme.
Os sonhos reinam num reino mal governado, a salvação que tarda em não chegar, e aí, a ansiedade. Sofrimento de quem espera o que não sabe se há-de vir, impaciência.
A alma que se embrulha no fervor desta emoção, a saliva acre de cinzas passadas, pesadas, na língua. O odor carregado que esgota o ar e que me sufoca incessantemente. O espaço que se torna demasiado claustrofóbico e pequeno para o meu ser rendido à esquizofrenia de tentar raciocinar.
Ansiedade?
As crenças vacilantes, os receios, as questões por deslindar. O anseio.
As dúvidas existenciais, a personalidade posta à prova num torneio sem regras ou arbitragem corrupta. O chão que se desfia debaixo dos meus pés, o abismo constante de quem cai, cego, sem tacto. As certezas que nunca são certas, o positivismo ao qual se tenta agarrar com afinco.
Rasgo o tecido que me cobre. De tesoura na mão, corto cada linha que une os trapos que uso para me proteger do frio que nem existe. Despido, nu, intocável. Assim entregue à mercê de quem quiser chegar, de quem quiser esticar a mão, ao desaconchego de uma outra insónia. Uma esmola que não bate no chapéu, uma melodia que ficou presa no acordeão.
Ansiedade… Que me ataca e apedreja numa espécie de batalha que não escolhi fazer parte, numa guerra em que apenas quero paz.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Já não...


Já não me imagino.
Já não sonho como outrora.
Já não sinto o meu odor, o paladar das minhas lágrimas que secaram.
Já não há nada, um vazio dentro de um todo que não consigo tocar.
Onde estou? Perdido dentro de mim. Baralhado neste ventre que eu próprio criei. Iludido? Ludibriado? Confuso… Supostamente um encontro comigo mesmo, um vislumbro de uma luz julgada extinta. Mas nada. Nada surge escrito no meu livro e prossigo descalço, novamente.
Já não é hora?
Já não é hora de por um momento algo estar resolvido?
Pode parecer que estou livre, mas continuo preso a esta teia pegajosa de dúvidas e insatisfações. De mágoas e contradições. De becos sem saídas e estradas sem sentido. Onde?
Onde sou?
Onde faço?
Onde quero?
O que quero? O que faço? O que sou? O quê, onde?
Já não… Já não encaixo as palavras no meu raciocínio, que quebrado já quase não existe. Já não encontro o que perdi, nem chego a perder porque nada há por despegar. Já não sinto a dor, a cruel e violenta.
Já não…
Hoje.
Quem sabe amanhã…