terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Segredo


Desonesto! A realidade é para ser transmitida, sendo assim, é necessário dizer que não fui sincero comigo, com os outros.
Enrolei-me numa teia de mentiras que apenas por um golpe de sorte, não fui devorado pela aranha, sua criadora. E era tão fria esta teia, esta falsidade precária e bisonte.
Talvez fosse necessário este fingimento, talvez algo que tivesse de acontecer. Certezas não as há, pois essas tardam a chegar e quando chegam, apenas nos servem de lição. Apenas sei que foi uma história com passado e que é assustador relembrá-la. Maquiavélica. Suja. Vendida!
Ruas de uma vida onde batia a portas desconhecidas, que me podiam trazer os mais perigosos perigos. Um corpo que se colocava numa montra de necessidades incompreendidas. Facilidade, era o que se proponha!
Não posso dizer que me orgulho do que fiz, até porque as razões que me levaram a tal, não eram necessariamente convencionais. Mas era fantástico sentir-me desejado, nem que fosse pelo facto de ser usado. O cérebro bloqueava com o perigo e eu apenas queria o que tantos têm a mais.
Olho para trás e levanto-me para agradecer não ter caído num buraco profundo, do qual não fosse capaz de sair.
Fui confundido com seres cujos objectivos eram bem diferentes. Fui enaltecido por este espírito forte que me levava a lutar diariamente. E disseram-me tantas vezes para sair deste segredo. Os amigos, que sabiam, os outros que lá estavam comigo por momentos. Eu sabia que estava errado agir assim. Que não tinha necessidade de estar ali, a mentir, a oprimir, a denegrir-me. Mas já era tudo um vício forte que me prendia a um pilar coberto de cobras.
E era mágico! Porquê? Tentem perceber o quão é importante para todos nós sentirmo-nos desejados por alguém. Fiquem por aí. O desejo. Agora vão até um local onde todos os olhares são desejo. Onde todos nos querem. Onde se oferecem oportunidades de uma vida. Onde se falam de sonhos e se propõe a realizá-los. Era esta a magia que eu encontrava ali, tão à mão de semear.
Bem sei, que a maior parte desta vivência foi toda uma mentira, recheada de falsas promessas, de fortes enganos, de personalidades movidas por desejos meramente carnais. Mas sabia bem ser enganado docemente. Era como se nos passassem uma pequena camada de seda, numa pele de cacto.
Sentia-me um objecto, um peão num tabuleiro onde não era eu que comandava o jogo, mas era tão aliciante cada jogada, sempre nova e alternativa. Tudo podia mudar num segundo, ou não. Podia até entrar no jogo e nunca jogar, mas só a entrada valia a sensação.
Não sei se voltarei a encontrar as sensações que desfrutei ali, mas também não lhes sinto a falta, são hoje uma experiência sem orgulho. São hoje uma aprendizagem que fazem parte de mim, que estão vincadas no meu passado e que são hoje parte de mim, do que sou.
E é tão místico, o facto de não se perceber que pessoas comuns como nós, não possam esconder estes segredos. É inimaginável que alguém com o futuro no seu caminho, longo, possa tomar tais atitudes, tais deslizes psicológicos. Não quando se tem capacidades para dar muito mais, quando se tem capacidades para lutar, para dar a volta de uma outra forma, quando até se pode ser muito mais do que alguma vez alguém ambicionou ser.
Isto não é a marcação de um desgosto, de uma revolta, de um ódio, mas sim a delineação de que este parágrafo foi importante para me encontrar. E deve este, por agora, continuar como é, segredo de mim, deste retalho. É cedo para se descobrir que afinal não sou tão puro como se possa pensar. Que tenho recantos de mim onde a lixívia passou e não conseguiu penetrar, que afinal sou igual a tantos julgamentos que se fazem. Mas no fundo, tudo passou, e hoje sou a soma dessa passagem com tantas outras.
Segredo obscuro! Esta vida está recheada deles e eu sou apenas mais um que os possui. Era importante passar por aqui.
Segredo vertiginoso! É preciso gostar de aventuras, este foi o meu sentido de aventura. Colocar a vida em perigo.
Segredo!

"Não contes do meu
vestido
que tiro pela cabeça
nem que corro os cortinados
para uma sombra mais espessa.
Deixa que feche o
anel
em redor do teu pescoço
com as minhas longas
pernas
e a sombra do meu poço.
Não contes do meu novelo
nem da roca de fiar
nem o que faço
com eles
a fim de te ouvir gritar"

Maria Teresa Horta

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